Seres sinestésicos têm uma necessidade desconfortante de sentir.
Eu me descobri irremediavelmente sinestésica e viciada nas experiências da matéria.
Da dor ao prazer, do som ao silêncio, tudo carrega um significado que transcende os limites de sinapses e impulsos elétricos. É cheio de mistério e indescrição.
A reação ao sentir é o caos concentrado.
A matéria, a carne, é o templo das sensações e merece adoração. Se há existência pós matéria, acredito que merecemos desfrutar de cada gota de estímulo que só a matéria permite sentir. É ela quem vai registrar na nossa essência a naturalidade do sentir em silêncio, do instinto, da nossa origem primitiva esquecida.
E eu falo da simplicidade da rotina e não da sexualidade que aprendemos a limitar e tolher por simples convenção social.
Eu falo da beleza de sentir a própria pele pela manhã, ao acordar, e como ela se transforma no decorrer do dia. É sentir o aroma da chuva antes que ela caia e degustar lenta e verdadeiramente uma fruta, um chocolate ou um beijo. É aquecer as mãos no fogo e perceber o quão reconfortante isso chega a ser para todo o corpo. É andar descalço e sentir as texturas do solo. Ouvir o silêncio.
Essa adoração é permitir a ausência das palavras e das convenções e voltar-se para o sentido único das coisas. É romper com paradigmas e permitir que cada centímetro do corpo seja capaz de reagir à sua forma a cada estímulo externo.
É romper com o medo. Romper com a crença de corpo como matéria pecaminosa e desprovida de divindade. O divino está no natural, na nossa origem primitiva sensorial.
Eu me descobri irremediavelmente, viciada, dedicada e apaixonadamente sinestésica. Abro mão das palavras e das normas quando me permitem acessos à abstração divina do sentir.
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